27/12/2012

cognatos, falsos e verdadeiros

Volta e meia, ouço dizerem "falsos cognatos" para designar palavras de grafias semelhantes em línguas diferentes, como, por exemplo, eventual em inglês e "eventual" em português, actual/"atual", relevance/"relevância" e assim por diante.

Sinceramente fico um pouco aflita. Um cognato quer dizer uma palavra com a mesma origem de outra, seja na mesma língua, seja em duas ou mais línguas diferentes - só isso. Em eventually e "eventualmente", por exemplo, temos um caso de verdadeiro, não de falso cognato. Quero dizer, são cognatos mesmo! Se o sentido de  eventually hoje em dia é muito diferente do sentido de "eventualmente" em português, não é porque não tenham a mesma origem etimológica; é porque a evolução semântica dos termos - que, repito, são realmente cognatos - foi diferente, resultando em sentidos diferentes.

O que me parece que acontece, é que às vezes as pessoas dizem "falso cognato" querendo dizer "falso amigo". Ou seja, uma palavra estrangeira para a qual o tradutor acha que há uma palavra tão parecidinha em sua língua que até fica fácil - mas acontece que o sentido de uma é diferente do da outra, e por isso acaba sendo quase uma armadilha: a tal palavrinha tão fácil acaba se mostrando uma amiga da onça, uma falsa amiga.

Então, caros iniciantes e principiantes, quando forem se referir a essas falsas amigas, não digam que são falsas cognatas: boa parte dessas amiguinhas da onça são é cognatos bem verdadeiros, cognatos da gema!

Este é o ponto número 1.

O ponto número 2 é que também existem palavras que são bem hipócritas em sua aparente amizade para com o tradutor, mas não porque eram filhas da mesma mãe em priscas eras e depois cada qual seguiu seu caminho e nunca mais se viram. Simplesmente podem não ser cognatas, isto é, nem ter o mesmo tataravô em comum: por exemplo, aceitar em espanhol e "aceitar" em português - só têm uma grafia enganadoramente parecida, mas não têm e jamais tiveram qualquer etimologia em comum. São falsas amigas, sim, e são falsas cognatas também - quer dizer, podem fazer a gente pensar que, séculos ou milênios atrás, aceitar e "aceitar" eram irmãs, só que nunca foram: o azeite de origem fenícia chegou ao espanhol através do árabe, enquanto o aceite em português vem de um singelo acceptare latino. Só neste caso é que poderíamos dizer que são "falsas cognatas", ou seja, apesar da semelhança na grafia, não têm parentesco nenhum.

Mas em boa parte dos casos, repito, os falsos amigos que vêm visitar o tradutor são mesmo cognatos, e  chamá-los de "falsos cognatos" muitas vezes acaba sendo despropositado.